Aqui está a paixão de quem atravessa a noite do mundo...
Espiando o deserto da cidade numa carruagem de metropolitano...
Sabes, perdi o rasto do pai e da mãe,
durmo onde calha, mas isso não vemos na fotografia.
Tenho tempo.
As calças que me deram hão-de ajustar-se à medida do meu corpo...
A noite comeu a pequena alegria do coração.
O puto de cabeça rapada talvez seja apenas uma visão,
pouco vemos do seu rosto franzino...
Os milhões de rostos, daquele rosto inclinado para o peito,
o olhar absorto no enigmático trabalho das mãos... uma moeda?
Uma caixa de fósforos para incendiar o susto da noite?
Insondável jaula de néon onde te movimentas,
mudas de alcunha para te manteres inacessível ao insulto,
mas a pobreza é coisa que não se remedeia com a venda do corpo e de pensos rápidos.
Já aqui não passam metropolitanos...
A esta hora em que subúrbio de lata te escondes?
vem comigo...
Ensinar-te-ei o uso da fuga e o minucioso oficio das facas...
Depois esperaremos o primeiro metro da manhã
e iremos ver as árvores dos jardins subterrâneos...
Al Berto
"Jaula de Néon" in O Último Coração do Sonho
(originalmente in Salsugem)
Há 7 meses
Sem comentários:
Enviar um comentário